Razões e origens da orientação dos títulos nas lombadas
O acto de procurar um livro específico ou o mero acto de deambular à procura de algum título interessante ao longo de uma prateleira carregada de livros, facilmente se torna num exercício involuntário para o pescoço. O sentido dos textos escritos nas lombadas não é uniforme. Tanto pode ser escrito de “cima para baixo” ou de “baixo para cima”1, o que obriga a oscilarmos a cabeça de um lado para outro enquanto procuramos.
Na altura da infância dos livros impressos, entre 1455 e 1500, período onde os livros se passaram a designar como “incunábulos”, a noção de lombada com informação não existia. Nesses tempos, as quantidades de livros impressas eram tão pequenas que não era comum as lombadas sequer serem impressas. Aliás, na estante, as lombadas não costumavam ser viradas para o leitor, era exactamente o contrário.
Com o aumento de volume de produção no século XVI, surgiram muitos livros para escolher e procurar, o que motivou a impressão da lombada com informação. A forma inicial de escrever essa informação era tendencialmente horizontal, ou seja, perpendicular à lombada. Quando o volume de produção se multiplicou e os livros começaram diminuir na espessura, a opção de escrita da informação na lombada foi de “cima para baixo”, pela pragmática razão de que se o livro estiver em cima de uma mesa, a lombada continua a ter leitura.
Porém, com o passar do tempo e acumulação de livros, percebeu-se que as lombadas escritas de cima para baixo têm desvantagens de leitura óbvias. Invertendo o sentido da escrita, para “de baixo para cima”, torna mais eficaz alguns pontos:
- a maior parte das pessoas são dextras, manuseiam os livros com a mão direita. É mais natural virar a cabeça para a esquerda, e usar a mão direita para apontar ou segurar o livo;
- como o sentido da leitura no ocidente é da esquerda para a direita, esta opção ajuda à progressão pela fileira de livros.
- numa estante com livros de diversos tamanhos, os títulos ficam todos alinhado na base da prateleira, ficando o início dos textos potencialmente mais alinhados2, logo com leitura facilitada, pois os nossos olhos saltam de uma lombada para outra sempre na mesma linha.
Gradualmente, a opção mais moderna de “baixo para cima” foi ganhando adeptos e foram-se sintetizando duas facções. Apesar da ausência generalizada de normalização e mesmo em locais onde era habitual usar tendencialmente uma das formas, durante alguns períodos é possível verificar o uso da oposta. Ainda assim, sem grande objectividade e de forma muito generalista, a fórmula usada na Europa ocidental, continental era a “de baixo para cima”, ou como alguns apelidavam “moda europeia” apesar da Rússia a usar e dos russos terem normalizado esta opção3. A opção oposta, também conhecida como “anglo-saxónica” é preferida no Reino Unido, países nórdicos e Estados Unidos.
A revolução digital, a globalização, os novos meios de impressão e a ausência de convenções ou imposições, possibilitaram que o sentido das informações da lombada sejam determinados por quem os concebe ou desenha, esbatendo as tendências locais. Como tal, podemos ter livros (ou CD/DVD, etc.), com lombadas na horizontal, escritas em ambos os sentidos ou até combinando a horizontal com uma das outras formas no mesmo local. Dessa maneira continuamos a ter a garantia de podermos exercitar o nosso pescoço antes de exercitar a mente.
Notas
1Nos casos dos livros de lombada espessa, o título costuma surgir na horizontal.
2Excluem-se aqui os que têm os títulos centrados. Ainda assim, no geral, facilita a consulta.
3 Decisão de 5 de Junho de 2002 pelo Conselho Intergovernamental de Padronização, Metrologia e Certificação (inclui as antigas soviéticas com a excepção das repúblicas bálticas).